cada lugar na sua coisa

fotos: daryan dornelles


Muito provavelmente, você já deve ter dançado ao som do tecnobrega de Gaby Amarantos ou Bonde do Eletro. Assim como é quase certo que tenha passado os olhos pelo YouTube e visto algum clipe de Karol Conka, Graveola e o Lixo Polifônico e Apanhador Só. Ou, no trabalho, tenha acessado alguma rádio virtual e ouvido uma música ou outra de Maglore, Leo Fressato ou Rabujah. Originários de diferentes cenas do país, estes músicos comprovam que a música brasileira vive um período de forte expansão e diversidade. Afinal, sem depender das engrenagens das grandes gravadoras e adotando um modus operandi bastante peculiar, estes artistas vêm conseguindo desenvolver suas carreiras, demonstrando capacidade empreendedora e interagindo com um público receptivo ao trabalho autoral e independente. Entretanto, este processo de democratização, além de trazer à tona cenas que, até bem pouco tempo, eram preteridas ou marginalizadas pelas mídias tradicionais, também atestou o forte caráter centralizador destas últimas ao evidenciar a superficialidade com que se debruçam sobre um material tão rico e repleto de especificidades. Exemplo claro disto é o desconforto gerado nas famosas listas de melhores do ano das revistas especializadas e nas grandes premiações da música brasileira, onde público, crítica e artistas vivem um diálogo atabalhoado que realça as deficiências de nossas políticas culturais e a vulnerabilidade das cenas emergentes frente ao atual mercado fonográfico.
Nascido em Cachoeiro de Itapemirim e oriundo da cena capixaba, o cantor e compositor Juliano Rabujah iniciou sua carreira em 2001, ao formar com colegas de faculdade, em Viçosa (MG), o grupo de samba-rock Tabacarana. A banda, que chegou a dividir palcos com Pedro Luís e A Parede, BNegão, Skank e Marcelinho da Lua, lançou, em 2011, o disco “Virei no Samba”. Neste mesmo ano, realizou uma turnê pela Europa, apresentando-se na França, Inglaterra, Irlanda e Espanha. Ainda em 2011, Rabujah lançou seu primeiro disco solo, “O Que Meu Samba Tem”, realizando uma série de shows em Vitória. No ano seguinte, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se apresentou em diversas casas, como o Studio RJ, La Esquina e Sala Baden Powell. Em 2013, em meio à produção de seu próximo álbum, Rabujah passou a integrar o Trova à Troá, trio formado por ele e pelos músicos Gustavo Macacko e Brunno Monteiro. Também voltou a flertar com o samba-rock, ao participar da banda Jaujau, ao lado dos cariocas Guido Sabença e Gabriel Menezes.
Interessados em saber a respeito dos diferentes cenários musicais do país, convidamos Rabujah para uma entrevista. O músico, que lançou esta semana o EP "Quarto e Sala", recebeu o Banda Desenhada em seu estúdio, no apartamento onde mora, na Tijuca, e nos falou, entre outros assuntos, de sua carreira, referências e a cena independente de Vitória.

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da sérvia, com amor

fotos: daryan dornelles
Mesmo que não se fale tanto a respeito, o produtor sérvio Mitar Subotić, o Suba, foi, ao final dos anos 90, um dos principais responsáveis pela criação de uma nova estética na música popular brasileira. Radicado em São Paulo, desenvolveu um trabalho inovador ao unir elementos da música popular à eletrônica. União esta que também foi utilizada por diversos artistas, como Otto, Max de Castro, DJ Patife, Rica Amabis, Beto Villares, BID, Lucas Santtana, Arícia Mess, Katia B, Cibelle, Bebel Gilberto, Bossacucanova, DJ Dolores e outros tantos vinculados ao selo belga Ziriguiboom e às gravadoras Trama e YB Music. Ao lançar em 1999 o álbum “São Paulo Confessions” (Ziriguiboom), Suba também teve o mérito de recolocar a música brasileira nas paradas mundiais, algo que até então era exclusividade da bossa nova. Deste disco, repleto de participações especiais, despontaram duas novas cantoras que vieram a se destacar na música brasileira: Cibelle e Katia B. Toda essa movimentação no cenário mundial se tornou mais nítida quando Suba produziu, ainda em 1999, “Tanto Tempo” (Ziriguiboom), o bem sucedido álbum de Bebel Gilberto. Entretanto, com a sua morte precoce e a saturação natural do mercado, o que se viu nos anos seguintes foi certa rejeição por parte da crítica – principalmente a brasileira – a um tipo de música que acabou sendo rotulada de lounge e que se deteriorou rapidamente ao ser utilizada à exaustão por uma infinidade de artistas de primeira hora que se deslumbraram com a possibilidade de se inserirem no mercado internacional. Contudo, o trabalho dessa geração foi importantíssimo para a incorporação de diversos elementos à música brasileira, como o dub, o trip-hop e o drum and bass, influenciando nomes da atual música popular, como Céu, Bruno Morais, Curumin, Gui Amabis, Claudia Dorei, Anelis Assumpção e Dois em Um.
Uma das artistas seminais dessa estética, a carioca Katia B começou sua carreira aos 17 anos, ao participar como atriz do musical “A Chorus Line”. Chegou a atuar no cinema, em filmes como Bar Esperança (1983) e Ópera do Malandro (1987), e em minisséries e novelas para TV. Também foi personagem ativa na fundação do Circo Voador, nos anos 80 no Rio de Janeiro. Fez parte também da Falange Moulin Rouge de Fausto Fawcett, com quem gravou o CD “Básico Instinto” (1993). De forma independente e virtual, lançou seu primeiro disco em 1999, fazendo a sua prensagem apenas no ano seguinte. Nele, além de composições próprias e parcerias, interpretou canções de João Donato, Herbert Vianna, Vitor Ramil, entre outros. Neste mesmo ano, foi lançado o álbum de Suba, “São Paulo Confessions”, onde participou na faixa “Segredo”. Três anos depois, participou do disco em homenagem ao produtor sérvio, intitulado “Suba Tributo”. O mais autoral de seus trabalhos, “Só Deixo Meu Coração Na Mão de Quem Pode”, foi lançado em 2003. Com ele, Katia realizou diversas apresentações na Europa e no Japão, vindo a lançar, no ano seguinte, seu primeiro DVD, homônimo ao disco, com a apresentação do espetáculo no instituto Itaú Cultural, em São Paulo. Em 2007, lançou “Espacial”, onde regravou dois clássicos da MPB: “Cais”, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, e “Amor em Paz”, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes. Neste período, fez participações especiais nos álbuns de Plínio Profeta, Vitor Ramil e Marcos Suzano. Lançou em 2012 seu quarto trabalho, “Pra Mim Você é Lindo”, onde privilegiou seu lado intérprete ao cantar músicas de Lamartine Babo, Caetano Veloso e Jacques Dutronc. Ao longo da carreira, Katia destacou-se também como compositora, fazendo parceiras com diversos músicos, como Fausto Fawcett, Lucas Santtana, Teresa Cristina, Suely Mesquita, Rubinho Jacobina, JR Tostoi e Jam da Silva.
Em meio aos ensaios para a sua apresentação no Auditório Ibirapuera (SP), Katia aceitou o convite do Banda Desenhada para esta entrevista, realizada no café da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio. Ali, conversamos longamente a respeito de sua carreira, Suba e a cena independente do país.

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cérebro magnético

fotos: daryan dornelles
Alguns certamente dirão: “O quê?! E desde quando Cadu Tenório virou neoMPB?”. Outros, mais cínicos, talvez pensem: “Ahã, improvisação e música experimental é tão popular, né?”. E os mais exaltados irão esbravejar: “P*! De novo esse papo de neoMPB?! Que m* é essa, c*?”. Bem, a grande questão é que a música popular e a sua indústria mantenedora passaram por grandes transformações nos últimos vinte anos. Enquanto o mainstream tornou-se extremamente restrito, abrigando artistas que, em sua maioria, possuem enorme apelo popular, coube à cena independente gerar trabalhos mais ousados, sem necessariamente contestar o que esteticamente a precedeu. Por conta disso, parte desta nova geração chegou a ser rotulada de neotropicalista, graças aos vínculos com alguns cânones desse movimento. Entretanto, ao longo da década de 2000, músicos relacionados a gêneros até então incomunicáveis com a MPB também conseguiram espaço nesse cenário, trazendo a tona influências de post-rock, industrial, electroclash, indie pop, entre outros. Esta ascensão tornou-se clara quando, ao produzir “Recanto” (2011, Universal Music), o elogiadíssimo álbum de Gal Costa, Caetano e Moreno Veloso solicitaram a colaboração de Duplexx e Rabotnik, nomes associados à música de improviso e experimentação carioca. Todos esses entrecruzamentos desgastaram bastante o termo MPB, tornando-o obsoleto por ter, em sua origem, gêneros agora vistos como indesejáveis e anacrônicos, caso da bossa nova e da música regional. Entretanto, conceitualmente, a sigla continuou mantendo uma de suas principais características: a capacidade de absorver estilos distintos, intercambiando e aglutinando-os das mais diversas formas. Assim, por essa ótica e com certa ironia, pode-se dizer que nunca a música produzida no país foi tão “MPB” como agora. E é a partir deste ponto de vista que o Banda Desenhada adotou para si o termo neoMPB. Por mais que também o achemos questionável, ele ainda é o que melhor classifica a produção brasileira contemporânea. Produção esta que teve como estopim a crise de um mercado e que gerou uma nova dinâmica de produção, divulgação e comercialização de uma música que, mesmo “impopular”, traz em si, em maior ou menor grau, o substrato da MPB. Assim, nada mais lógico para nós do que dialogar com a chamada cena experimental carioca. Composta por nomes como Cadu Tenório, Chinese Cookie Poets, Rabotnik, Negro Leo, Bemônio, Dorgas e Duplexx, a cena passou a ganhar destaque na mídia a partir de 2011, muito por conta dos blogs especializados e do pequeno, mas heroico, circuito de casas que abrigam estes artistas.
O mais prolífero e inquieto destes, Cadu Tenório encabeça cinco projetos: Sobre a Máquina, VICTIM!, Santa Rosa’s Family Tree, Ceticências e Gruta. Lançou, em diversos formatos e suportes, nada menos que 14 discos em um período de três anos. Flertando com o noise, industrial, post-rock, dark ambiente, drone e minimal, seu trabalho se caracteriza pela improvisação e pesquisa sonora de elementos do seu dia a dia. Em 2010, ao lado de Emygdio Costa e Ricardo Gameiro, lançou o primeiro EP do Sobre a Máquina, “Decompor”. No ano seguinte, lançou os EPs “Areia” e “Anomia”, do Sobre a Máquina, e “Please Don’t Be Shy/It’s Not So Easy But I’ll Try”, este último pelo Ceticências. Em 2012, lançou “I Like To Smell The Dirty Panties That You Leave In The Bathroom”, primeiro EP do Santa Rosa’s Family Tree, o EP “Beksiński Hug” pelo Ceticências, os álbuns “This Is What You Love, Young Man, And It Isn’t Beautiful!” e “Sexually Reactive Child” pelo VICTM!, “Sobre a Máquina” pelo projeto homônimo – agora contando com o saxofonista Alex Zhemchuzhnikov – e “Grito”, primeiro disco do Gruta, parceria com Thiago Miazzo. Neste mesmo ano, fundou com Thiago a TOC Label e participou do festival Novas Frequências, sendo o único artista brasileiro convidado desta 2ª edição. Em 2013, lançou “Lacuna” e os EPs “Lar” e “Ecos” pelo VICTIM! e o álbum “Issamu Minami” pelo Ceticências. Seus trabalhos com o Sobre a Máquina recebeu elogios e chegaram a figurar na lista de melhores do ano em diversos sites e blogs nacionais e estrangeiros.
Em meio a apresentações e envolvido na produção do segundo disco de seu parceiro Emygdio, Cadu aceitou ser entrevistado pelo Banda Desenhada. Conversamos a respeito de sua carreira, influências, cena experimental, MPB e outros assuntos. A entrevista desenvolveu-se através de constantes trocas de e-mails e conversas em redes sociais.

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e volto pra curtir

fotos: daryan dornelles

É redundante dizer que a neoMPB possui fortes ligações com a produção musical dos anos 60 e 70, em especial, com a tropicália e a sua figura mais célebre: Caetano Veloso. Sem qualquer esforço, há de se observar a desenvoltura com que este vem dialogando e, de certa forma, se apropriando da geração 00. Em seus mais recentes trabalhos, Caetano deixou evidente não só a durabilidade de seu legado, mas também a sua capacidade de se mesclar à atual produção musical do país. Contudo, outros artistas de igual importância também vêm se mostrando intimamente ligados às novas gerações. Geniais, mas considerados por muito tempo “malditos” pela imprensa e pelas grandes gravadoras, Tom Zé, Jorge Mautner, Jards Macalé e Itamar Assumpção (falecido em 2003) passaram por períodos de total ostracismo até, nos últimos anos, ganharem visibilidade e reconhecimento através de relançamento de álbuns, documentários ou parcerias com novos nomes da música. Violonista primoroso e um dos mais importantes compositores do país, Macalé tornou-se notório por suas declarações que, mesmo cercadas de humor, o levaram a ter embates antológicos com diretores de gravadoras e colegas de profissão. Sua postura radical e seu discurso sem firulas o obrigaram a passar longo tempo fora da mídia e do mercado fonográfico. O que foi brutalmente nefasto não só para a sua carreira como para a sua vida pessoal.
Operando em diversas frentes, Macalé esteve intimamente ligado aos principais nomes de vanguarda de sua época. Transitou pelas artes visuais, tornando-se amigo de Hélio Oiticica e Lygia Clarke e colaborando com Rubens Gerchman. Em sua homenagem, Oiticica criou em 1978, a instalação “Macaleia”. Jards também atuou e foi responsável pelas trilhas sonoras dos filmes “O Amuleto de Ogum” (1974) e “Tenda dos Milagres” (1977), de Nelson Pereira dos Santos. Sua relação com o cinema o levou a fazer trilhas para filmes de Joaquim Pedro de Andrade, Glauber Rocha, Antônio Carlos Fontoura, Hugo Carvana, entre outros.
Musicalmente, além de dialogar com os tropicalistas, Jards participou de alguns importantes espetáculos de protesto, como “Arena Canta Zumbi” e “Opinião”. Em 1969, causou estardalhaço ao participar do 4.º Festival Internacional da Canção com a música “Gotham City”. No ano seguinte, lançou seu primeiro compacto, "Só Morto (Burning Night)”, e dirigiu Gal Costa no disco “Legal”. Neste período, a cantora tornou-se sua principal intérprete, tendo em seu repertório “Hotel das Estrelas”, “Vapor Barato”, “Mal Secreto”, “Pulsars e Quasars”, “Love, Try and Die”, “The Archaic Lonely Star Blues” e “Pontos de Luz”. “Vapor Barato”, apresentado pela cantora  no espetáculo "-FA-TAL-", aderiu-se de forma definitiva ao seu repertório, ganhando, décadas mais tarde, novo destaque ao ser trilha do filme “Terra Estrangeira” (1995), de Walter Salles, e ser regravada pelo grupo O Rappa. Em 2012, foi novamente interpretada por Gal, na turnê “Recanto”, sendo o ápice do espetáculo em seu festejado retorno aos palcos.
Ainda nos anos 70, Macalé foi responsável por dois dos mais importantes discos da música brasileira: “Transa” (1972), de Caetano Veloso, gravado em Londres sob sua direção; e seu primeiro álbum, “Jards Macalé” (1972). Neste, firmou importantes parceiras com os poetas Capinam, Waly Salomão, Torquato Neto e Carlos Eduardo Machado (Duda). O álbum ganhou vida nova em 2007, ao ser revisitado por Jards na terceira edição da Virada Cultural, no Teatro Municipal de São Paulo. Cinco anos depois, o disco foi relançado em vinil pela Polysom, sendo acompanhado por apresentações no SESC Belenzinho (SP), pelo projeto “Álbum”, e no Instituto Moreira Salles (RJ), na oitava edição do projeto “Grandes Discos da Música Brasileira”. Este ano, foi a vez de seu primeiro compacto ser reeditado pelo selo Discobertas, acrescido de 10 faixas bônus com registros de sua produção setentista.
Em nova fase e bastante assediado, Jards vem sendo convidado nos últimos anos a realizar parcerias, shows e gravações ao lado de seus contemporâneos, como Kassin, Pedro Sá, Graveola e o Lixo Polifônico, Brasov, Mombojó, Ava Rocha, Dorgas, Thais Gulin, entre outros. Além disso, o músico passou a ser acompanhado em seus shows pela Lets Play That, a jovem banda composta por Leandro Joaquim, Thiago Queiroz, Victor Gottardi, Ricardo Rito, Thomas Harres e Pedro Dantas. Jards passou também a ser homenageado no cinema, sendo objeto de estudo em dois documentários: “Um Morcego na Porta Principal” (2008), de Marco Abujamra e João Pimentel, e “Jards” (2012), de Érik Rocha. Este último retratou o processo de gravação de seu décimo primeiro álbum, “Jards” (2011), lançado pela Biscoito Fino. Em 2013, já merecidamente entronizado e cercado de novos fãs e parceiros, o músico comemorou seus 70 anos em um histórico show no Circo Voador, no Rio, e, dias depois, no Auditório Ibirapuera, em São Paulo.
Citado repetidas vezes como referência pelos artistas que passaram pelo Banda Desenhada, Jards Macalé foi o escolhido para a entrevista comemorativa dos dois anos do site. O músico, em meio a uma agenda cheia e prestes a embarcar para Nova Iorque para a exibição do documentário “Jards” no MoMA, nos recebeu em março, em seu apartamento, no Jardim Botânico. Conversamos a respeito de sua carreira, álbuns, a relação com as novas gerações e a admiração por Gal Costa. Recebemos também a sua permissão para uma homenagem: o lançamento do álbum virtual “E Volto Pra Curtir”, com 11 artistas reinterpretando seu disco de estreia. O álbum estará disponível para download por tempo determinado, sendo, em seguida, colocado para streaming.
Tenham uma ótima leitura e excelente audição.

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maciunas vol.1 a.k.a. sic, sic, sic

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e foi bahia pra todos os cantos

ilustrações: filipe cartaxo

Decididamente, a Bahia não se resume à axé music, tampouco esta representa a totalidade de gêneros musicais produzidos naquele estado. O termo, surgido no final dos anos 80, foi utilizado de forma bastante pejorativa para designar a música desenvolvida por alguns blocos de trio elétrico de Salvador que passaram a misturar o frevo baiano com o samba-reggae. O axé ganhou enorme visibilidade nos anos 90, graças ao seu caráter pop e pelo forte marketing da indústria fonográfica e das mídias que vislumbraram  uma fonte de renda extremamente lucrativa na música de carnaval soteropolitana. Malvista por boa parte da crítica especializada, a axé music foi acusada de se apropriar de elementos dos blocos afro e do samba-reggae – originários das periferias de Salvador – , diluindo ou mesmo descontextualizando o seu discurso de valorização da cultura afro-brasileira. O gênero também provocou certa discórdia entre músicos baianos icônicos, sendo duramente criticado por Dorival Caymmi e defendido com afinco por Caetano Veloso. Contudo, mesmo que se pese a forma opressora com que a indústria do carnaval lida com a produção cultural local, foi possível, ao longo dos últimos anos, assistir ao aparecimento de uma nova geração de músicos que, aos poucos, vem retomando a diversidade musical da Bahia. Em uma árdua batalha, artistas, blocos afro, afoxés, trio elétricos independentes e outras organizações culturais conseguiram se apropriar de um pequeno, mas significativo, espaço do carnaval soteropolitano. Graças ao dinamismo das novas tecnologias e apoiados por políticas de fomento e incentivo à cultura, BaianaSystem, Marcia Castro, Marcela Bellas, Orkestra Rumpilezz, Cascadura, Maglore, Retrofoguetes, Mariella Santiago, Opanijé, Manuela Rodrigues e Vivendo do Ócio, entre outros, conseguiram impulsionar suas carreiras e ganhar visibilidade, participando de projetos e podendo circular por diversos festivais pelo país.
Reconhecido por ampliar as possibilidades de uso da guitarra baiana ao somá-la com a percussão afro-brasileira, o dub e o sound system jamaicano, o BaianaSystem é uma das principais figuras da atual cena independente da Bahia. Criado em 2009, é formado por seu idealizador Robertinho Barreto (guitarra baiana e vocal), Russo Passapusso (vocal), Marcelo Seco (baixo), Wilton Batata (percussão) e DJ João Meirelles, tendo como seu sexto integrante extraoficial, o fotógrafo e designer Filipe Cartaxo, responsável pela identidade visual do grupo. Anteriormente, Barreto já havia tocado ao lado de diversos artistas de Salvador, como Ivete Sangalo, Timbalada e Crac!, tendo integrado a banda Lampirônicos, com quem gravou dois álbuns, “Que Luz É Essa?” (2001) e “Toda Prece” (2004). Com o BaianaSystem, lançou o primeiro e homônimo álbum em 2010, contando com a colaboração de Lucas Santtana, BNegão, Gerônimo, Buguinha Dub, Chico Corrêa e Roberto Mendes. O grupo já participou de diversos projetos como “Conexão Vivo” (2010 e 2011) e “Levada Oi Futuro” (2011), além de ter se apresentado em festivais nacionais e internacionais como o Festival de Inverno de Garanhuns (2010), RecBeat (2011), Expo Shangai (2010), World Music Shangai (2011), WOMEX (2011) e Voice of Nomads (2012).
Vindo em janeiro ao Rio para participar do projeto “Sai da Rede”, no Centro Cultural Banco do Brasil, os rapazes do BaianaSystem foram convidados para esta entrevista, realizada no camarim após a  primeira apresentação no evento. Robertinho, Russo e João conversaram com o Banda Desenhada a respeito de seu processo criativo, da cena independente baiana e de seu mais novo trabalho, o EP “Terapia”.

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la banda usurpada v. 2 – bacurinha’s song

fotomontagem: márcio bulk
Então, que tal levarmos um papo sobre o pop rock dos anos 80? Ou melhor, os compositores do pop rock dos anos 80. Ou, sendo ainda mais específico: As letristas do pop rock dos anos 80. Algum espírito de porco poderá muito bem falar: “E teve alguma?!”. Poupe-me, ok? A primeira opção que vem à cabeça, claro, é Marina Lima. Mas é bom lembrar que, na época, era seu irmão e parceiro Antonio Cícero o grande responsável por suas letras. Bem, alguém, puxando pela memória poderá se lembrar de Dulce Quental, Virginie... mas tem certeza de que não está faltando uma outra menina nessa lista tão minguada? Pois bem, é sobre ela que eu quero falar: Paula Toller. E por favor, nada de torcer o nariz porque você é cool, hype, hipster, etc e tal e acha o som do Kid Abelha pop demais para seus ouvidinhos tão alternativos. A señorita acima citada, quer queira, quer não, foi a voz e o cérebro responsável por desenvolver o discurso feminino na música brasileira da época. E isso não é pouca coisa! Não mesmo! Ou você acha que era fácil uma garota dizer ao que veio em um cenário onde somente meninos ditavam as regras? Lembre-se de que Marisa Monte, Adriana Calcanhotto, Cássia Eller & cia. só foram aparecer um boooooom tempo depois.
Após a saída de Leoni, coube à Paula a responsabilidade pelas letras da banda. E que letras! Afinal, precisa ter, no mínimo, um pouco de culhão (ooops!) para escrever e cantar versos como: “Eu já nem me lembro bem/ Da primeira vez que eu dei” (“Agora Sei”). Estamos falando de sexo, meu bem, sexo! E isso, antes de Tati Quebra Barraco, Deise Tigrona e Valesca Popozuda virem com seu pussy power! Ou seja, Paula Toller já sinalizava em suas letras várias questões comportamentais de sua geração, em uma década pra lá de complicada em se tratando de relacionamentos e sexualidade – não se esqueçam do fantasma da AIDS e de que o brasileiro sempre foi chegado em uma misoginia básica. Paula, ao lado de Leoni, compôs uma das canções mais emblemáticas da época: Em “Como Eu Quero”, narra o embate de um casal, onde, de forma explícita e quase tirânica, a personagem impõe suas regras. Sem meio-termo, no cara a cara e pronto. Ainda ao lado de Leoni, escreveu e cantou a respeito de certas inseguranças do universo feminino: “A vida que me ensinaram/ Como uma vida normal/ Tinha trabalho, dinheiro,/ Família, filhos e tal/ Era tudo tão perfeito/ Se tudo fosse só isso/ Mas isso é menos do que tudo/ É menos do que preciso” (“Educação Sentimental II”) ou então em “Garotos”, quando sentencia “São sempre os mesmos sonhos/ De quantidade e tamanho”. Ao lado de Herbert Vianna, escreveu “Nada Por Mim”, onde a figura masculina fala para sua interlocutora: “Você me tem fácil demais/ Mas não parece capaz/ De cuidar do que possui/ (...)/ Me diz até o que vestir/ Com quem andar e aonde ir/ E não me pede pra voltar”. Ou seja, adivinhe quem está no controle dessa relação? Pois é, não é exatamente o XY... Continuando! Sozinha, Paula escreveu “Não é preciso ficar inseguro/ Não é possível concordar em tudo/ Somos amigos e isso é um bom motivo/ Prá gente ficar junto” (“Dizer Não é Dizer Sim”), “Não quero nada por gratidão/ Também nada pelo que me aconteceu/ Mesmo assim peço perdão/ Mesmo com razão” (“Eu Preciso”) e “Tudo o que eu desejo ver você já viveu/ Tudo o que eu quero ter um dia foi seu/ Não te surpreende o que tira o meu sono/ Não entendo o que te faz gostar do que eu sou” (“Mais Louco”). Manja DR? é tipo isso, na lata. E o que dizer de seu girl power “niuêive”? “Me deixa falar, me empresta um ouvido/ Me deixa falar, me presta atenção/ Se não me escutar, cuidado comigo/ Eu perco a razão/ Atiro tudo o que eu tenho na mão” (“Me Deixa Falar”)! Violenta, a menina. Também havia espaço para o lado punk da vida, como em “Paris, Paris” (“E o roxo no meu braço/ Já desapareceu/ Meu último vestígio seu”) e “Promessas de Ganhar” (“Vai pro céu, quem levou um tapa e deu a outra face?/ Vai pro céu, quem abriu os olhos e não viu a luz?”). E isso se pegarmos apenas a sua produção da década de 80, pois a moçoila até hoje continua escrevendo sobre esses temas, exacerbando ainda mais, a partir dos anos 90, a temática sexual, em canções como “Lolita” (“Tudo é Permitido”), “O Beijo” (“Iê Iê Iê”), a trilogia “Mil e uma Noites”, “Um Segundo a Mais” e “Por Uma Noite Inteira” (todas do álbum “Iê Iê Iê”), “Mãos Estranhas” (“Autolove”), “Derretendo Satélites” (“Paula Toller”, seu primeiro álbum solo), “Eutransoelatransa” (Pega Vida”) e “Poligamia” (“Pega Vida”).
Bem, depois de ter chegado até aqui e lido mais de uma lauda, só com muita má vontade você não perceberá a importância e influência, mesmo que indireta, do discurso de Paula Toller na canção popular e, sobretudo, nas gerações seguintes, onde surgiram diversas cantautoras, como Érika Martins, Pitty, Vanessa da Mata, Tiê, Nina Becker, Tulipa Ruiz, Bárbara Eugênia e Letícia Novaes (Letuce). Por essas e outras, por favor, pare de torcer esse nariz e se estrebuchar. Que coisa mais baixo astral! Pare de frescura, deixe de lado esse mimimi e blábláblá e saca só: Paula Toller é foda. Simples assim.


por márcio bulk


originalmente publicado na revista RODA #1.