pelas esquinas de sua casa


fotos: daryan dornelles







A história já é conhecida: nascido e criado na Cohab Juscelino, em Guaianases, Zona Leste de São Paulo, Marcelo Jeneci, aos 17 anos, conseguiu o seu primeiro trabalho como músico profissional, acompanhando Chico César em uma turnê internacional. Empunhava uma sanfona emprestada por Dominguinhos, um dos ilustres clientes de seu pai, Manoel, que entre outros ofícios, se dedicava ao conserto de instrumentos musicais. Em seguida, Jeneci passou a acompanhar diversos artistas da música popular brasileira, entre eles: Arnaldo Antunes, Elza Soares e Vanessa da Mata, com quem compôs a sua primeira canção,“Amado”. A música integrou a trilha da novela global “A Favorita”, fazendo enorme sucesso em todo o país e ganhando o Prêmio Multishow de 2009. Neste mesmo ano, seria a vez do cantor sertanejo Leonardo gravar uma de suas composições, “Longe”, para a novela “Paraíso”. No mesmo período, Jeneci viu o projeto de seu primeiro disco ser aprovado pelo Natura Musical. Lançado em 2010, “Feito Pra Acabar” foi produzido por Kassin, tendo as participações de Curumin e Edgard Scandurra. O disco, considerado um dos melhores do ano pela revista Rolling Stone e pela grande maioria da imprensa especializada, revelou a cantora Laura Lavieri, com quem Jeneci divide os vocais. Além das parceiras com José Miguel Wisnik, Luiz Tatit, Arnaldo Antunes e Chico César, o álbum trazia os arranjos para orquestra do cultuado compositor e violonista Arthur Verocai. Tornando-se um dos mais famosos e importantes nomes de sua geração, em 2011, Jeneci se apresentou no festival Rock in Rio, ao lado de Curumin, e recebeu o prêmio Multishow de melhor música  eleita pelo júri por “Felicidade”.
Vindo para o Rio para se apresentar no Circo Voador ao lado de Tulipa Ruiz em janeiro deste ano, Marcelo Jeneci foi convidado a participar do Banda Desenhada. Exausto após cumprir uma agenda cheia durante boa parte do dia, o músico foi bastante generoso em sua entrevista, não se abstendo dos assuntos mais delicados, como o seu envolvimento com a indústria fonográfica, a influência da música brega e a pecha de “MPB hype” que a sua geração vem recebendo.

BD – A sua estréia no Rio [em janeiro de 2011, no teatro Oi Casa Grande] foi surpreendente: Casa lotada, público animado e aplausos entusiasmadíssimos. Você esperava uma recepção tão calorosa?

Marcelo Jeneci – [Com um sorriso encabulado] Estava com um pouco de medo desse show. Não havia me apresentado aqui ainda. Nas outras experiências que tive aqui no Rio, tocando na banda de outros artistas, ouvia sempre que o público da cidade era difícil, que era preciso batalhar para ganhá-lo. O próprio Arnaldo [Antunes] me contou que ele, mesmo dentro dos Titãs, tinha esse medo. Então comecei a ter certo receio desse show, já que seria a minha primeira apresentação aqui no Rio e, ainda por cima, em uma segunda-feira, no mesmo dia do show da Amy Winehouse. Pensei: “Meu, primeira vez! Como é que vai ser? E se não for ninguém?! O lugar é grande e deve ser caro”... Realmente eu fiquei surpreso com o resultado. Essa situação me provou que a cidade pode não ter muitas casas de shows, mas tem muito público. Foi muito impactante. Depois da música “Feito para acabar”, o teatro levantou e aplaudiu... Vi na platéia o Lulu Santos, o Paulinho Moska, além de outros artistas e conhecidos. Foi superlegal. De lá pra cá, acabei perdendo o medo e vim outras vezes, como agora. 

BD - Você é um dos artistas que mais dialoga com músicos de outras gerações: Arnaldo Antunes, Chico César, José Miguel Wisnik, além de cariocas como Kassin e Zélia Duncan. Estes contatos sempre foram naturais? Nunca sentiu uma barreira por conta da idade atrapalhando a comunicação?

BD – Não, nunca senti. Sinceramente, não vejo porque ter esta preocupação. Também discordo desta ideia de delimitar as gerações. Porque, no fundo, todos estão tentando dar o melhor de si e, justamente por estarem nesta busca, procuram interagir, independente de suas idades... Olho tanto para os artistas mais velhos quanto para os mais novos e percebo o quão é importante ter esta liberdade. Os diálogos são um pouco como o pensamento, fluidos, podendo ir para o futuro ou para o passado... Acabo tendo estas parcerias com muita naturalidade. Sempre me posiciono como alguém que está ali para aprender algo. Há uma fluência natural quando me reúno para fazer música com o Zé Miguel, com o Arnaldo ou com a Tulipa. No fundo, cada um tem algo para dizer e, com certa intimidade, fica bem mais fácil chegar a um resultado que nos satisfaça. No fundo, acabo dialogando com quem já é meu amigo, com quem me proporciona esta intimidade. Não posso fazer uma música com alguém que me imponha algo. Sempre procuro me aproximar de quem gosta de me receber e que me deixa à vontade. Estou muito a fim de fazer música com o Erasmo [Carlos]. Temos conversado bastante ultimamente. E isto serve para ilustrar o que estou dizendo: o Erasmo está com 70 anos e eu com 29, mas em algum ponto a gente se parece. Então, temos que aproveitar este canal. 

BD – Por falar em Erasmo, muitas pessoas o comparam a Roberto Carlos e a Guilherme Arantes. Eles realmente são referências para você?

Marcelo Jeneci – São duas comparações pertinentes. O Roberto de fato é uma referência direta da infância. Sou filho de pai pernambucano com mãe paulista e quando meu pai migrou para São Paulo, aos 16 anos, foi morar ao lado da casa da minha mãe, então com 10 anos. Quando ela fez 13, meu pai, muito interessado nela, começou a cantar músicas do Roberto Carlos em cima do muro que separava as duas casas. Logo eles se casaram e eu nasci. Por isso as músicas do Roberto sempre estiveram presentes na minha vida. Não só por elas terem embalado o romance dos meus pais como também por alimentar uma saudade que meu pai tinha de sua terra, do agreste pernambucano, e da família que deixou por lá. Também ouvia muito Alceu Valença, Azymuth e trilhas orquestrais de filmes da época, como “Labirinto” [1986] e “História sem Fim” [1984]... Agora, quanto à segunda comparação, com o Guilherme Arantes, não há uma influência direta, mas talvez tenhamos um caminho parecido, eu acho. Assim como ele, sou um paulista que quer fazer música para todo o país. Quero sair de São Paulo e cativar o Brasil inteiro. Quero cativar quem estiver me escutando, do agreste pernambucano ao Mato Grosso, da Bahia ao Pará... O nosso caminho é parecido. O Guilherme emplacou várias composições suas em trilhas de novela e trouxe para a música popular certo lirismo, certo romantismo. O cara virou uma estrela com vinte e poucos anos! Outra característica em comum é o fato de tocarmos e compormos no piano. A comparação com o Guilherme Arantes vem mais das semelhanças dos nossos caminhos, da satisfação em fazer musicas românticas, do que uma influência direta sobre mim. Hoje eu ouço as suas músicas e percebo que de fato temos um pensamento semelhante. Talvez, através das novelas e de suas músicas que ouvi no rádio, eu o tenha absorvido de alguma forma. É complicado, porque estou falando de artistas incomparáveis. Eles estão anos-luz à frente do que eu faço. Posso gastar uma vida inteira para fazer uma música como as do Roberto e do Guilherme. O que, para mim, já seria uma busca muito satisfatória.

BD – A sua geração já foi chamada por alguns críticos, de forma um tanto pejorativa, de MPB hype  ou MPB indie.  Isto lhe incomoda?

Marcelo Jeneci – Toda vez que nos deparamos com o nascimento de algo, procuramos entender o que se passa e automaticamente colocamos aquilo inserido em um grupo ou criamos um rótulo que o padronize. É daí que vêm os termos hype e indie... Porém, por detrás de todos estes rótulos, sempre há um artista querendo fazer um trabalho sincero, verdadeiro e, às vezes, com muita dificuldade. Sei o significado de hype e indie e, honestamente, não me sinto fazendo parte disto. Existe uma preocupação no universo underground que é esta: você tem que fazer música para poucos. E aí quando você começa a ter sucesso, surgem os primeiros comentários: “Putz, o cara tá virando mainstream! Que merda, ficou ruim”! Só que, do mesmo jeito que o sucesso nunca foi garantia de qualidade, o oposto também não. Eu e Tulipa estamos percorrendo um caminho muito parecido e carregamos em nossas músicas alguns elementos em comum. Às vezes sobressai o lado mais pop, em outros momentos, utilizando o termo ao qual você se referiu, o indie. Mas no fundo temos a vontade de fazer uma música que seja vista como popular e brasileira, que diga algo para todos e não apenas para um grupo. 

BD – Muitas pessoas ao ouvirem seu álbum, acharam que você era influenciado pelo indie rock, ainda mais com a presença nos vocais da Laura Lavieri. Você costuma ouvir este tipo de som? 

Marcelo Jeneci – Toda vez que alguém faz este comentário eu questiono: “Indie rock quer dizer o quê? O que um indie ouve? Um indie de verdade tem que saber o quê”? Aí a pessoa bota o disco de um artista que eu nunca ouvi e percebo as semelhanças: “Ah, pode crer, vem desse lado”... As pessoas costumam perguntar muito o que eu ouço, mas, realmente, não ouço muita música. Basicamente, consumi mais os artistas que chegavam à periferia, sabe? Que tinham uma forte penetração nas massas e que tocavam em rádios populares. Estas foram as coisas que eu mais ouvi. Agora, tendo percebido essa ligação que fazem com o meu som, venho tentando ir atrás do que não conheço. Quando alguém me apresenta algo, fico curioso e escuto, tento encontrar as diferenças com a minha música. E acabo aprendendo mais. Estou em uma fase de adorar quem tem um Itunes muito indie! [Risos]. Fico querendo pegar as coisas e ouvir também, para entender do que é que estão falando. Mas é mais uma questão de pesquisa. É um olhar de fora. Se as minhas músicas se aproximam desse tipo de som é por acaso. Busco o arranjo ideal para cada canção, sem me prender a uma limitação de gênero. Eu me sinto livre para isto. Às vezes fica mais indie rock, em outras fica um pouco mais Roberto Carlos ou então Clube da Esquina... E por aí vai.

BD – “Longe” foi gravada inicialmente pelo Leonardo. Como é a sua relação com o sertanejo e este tipo de música mais popular?

Marcelo Jeneci – A repercussão foi maior do que o que de fato aconteceu. Talvez por ter envolvido o Leonardo. Na época eu comecei a perceber que as minhas composições gravadas por outros artistas estavam se tornando músicas de trabalho e faziam sucesso. A Vanessa da Mata já havia gravado “Amado” e o Arnaldo, no “Ao Vivo no Estúdio”, gravou “Quarto de Dormir”... Aí chegou esse convite, esse pedido de autorização para que o Leonardo gravasse uma música que iria para a novela e se tornaria música de trabalho. Aos poucos fui percebendo que havia um componente muito popular nas minhas canções, então encarei a gravação do Leonardo mais como um aviso e isto acabou me dando fôlego para gravar meu disco. E fiquei muito feliz quando ouvi “Longe” na voz do Leonardo. Fiquei emocionado, sabe? Achei foda. Mas a música tocou poucas vezes na novela e não teve grandes repercussões. Isto só se torna notícia em entrevistas. E aí, ao escreverem sobre mim, aparece nas entrelinhas:  “Ah, esse cara que é indie teve uma música gravada pelo Leonardo”! Mas acho bacana que esta notícia tenha reverberado e de algum modo aproximado esses dois extremos. 

BD – Mas a música sertaneja fez parte da sua formação?

Marcelo Jeneci – Eu ouvia na adolescência. Leandro e Leonardo... Os caras tocavam muito em programas de TV. Lembro deles no Programa Livre, do Serginho Groisman. Gostava muito de uma música deles e cheguei a colocá-la em uma fita cassete que punha para ouvir na hora de dormir. Não me lembro do nome dela. Já procurei, mas não achei... Só me recordo da introdução: havia uma flauta fazendo uma melodia que nunca esquecerei... Esse contato também se deu muito por conta das rádios. Não ouvia rádio em casa, mas para chegar ao metrô eu tinha que pegar o lotação ou algum transporte público e sempre havia um som ambiente para as pessoas ouvirem enquanto o trânsito nos deixava impacientes. Até hoje acho que sou um pouco assim. Eu ouço muito mais as coisas que chegam até mim do que as que procuro ou pesquiso.


BD – O seu álbum foi gravado a partir da aprovação no projeto Natura Musical de 2009, mas ao invés de ser lançado de forma independente, foi através da Som Livre. Por sinal, você é um dos poucos de sua geração que pertence a uma grande gravadora. Como tem sido a experiência?

Marcelo Jeneci – Foi lindo ter tido o apoio da Natura para a gravação deste primeiro disco. Tinha em mente que iria fazê-lo com ou sem patrocínio. O plano A seria ter o patrocínio da Natura, já  o plano G seria gravar o disco no GarageBand! [Risos]. Depois de pronto, apresentei o disco pra Som Livre, que passou a distribuí-lo. O próximo deve ser bancado por eles. A relação com as grandes gravadoras mudou muito. Todos estes artistas da cena independente podem gravar seus próprios álbuns sem o auxílio da grande indústria. Então, a gravadora acaba funcionando como uma parceira na distribuição do disco. Não há mais aquele monopólio e nem mesmo aquele peso. Acho que hoje em dia a interação entre o artista e a empresa é muito maior. Pela minha experiência com a Som Livre, posso dizer o seguinte: os caras não tem nenhum problema financeiro porque a gravadora continua vendendo milhões de discos de artistas de música sertaneja e gospel, além de trilhas de novela e discos internacionais licenciados. O Michel Teló faz parte do casting! Então eles estão bem pra caramba! [Risos]. Conheço o núcleo ativo e pensante da Som Livre, que é o Marcelo Soares [presidente da gravadora], o Guilherme Figueiredo, a Teresa Penna, o Marcelo Toller... A nossa relação é muita boa e a parceria acaba se estendendo para além do trabalho, sabe? Eles são muito legais, são muito verdadeiros. Não tem nada a ver com aquele monstro, do diretor da gravadora taxativo que diz que você vai fazer isto ou aquilo. Acho que acabei trazendo para a Som Livre um novo nicho que possui certo prestígio e que a agrada muito. A empresa me oferece um conforto e uma estrutura que realmente me interessam. Nossa troca está sendo muito boa. Ainda mais com o total respeito que eles têm em relação ao meu trabalho autoral. Posso fazer o que quiser. Eu os vejo batalhando como a gente, comigo e a minha equipe, para que o meu trabalho ganhe consistência e, aos poucos, fique mais conhecido. Hoje acredito que as gravadoras tenham um papel diferente do que elas já tiveram no passado. Ninguém mais precisa de uma grande estrutura para gravar seu próprio trabalho, nem mesmo para divulgá-lo. É possível fazer tudo em sua própria casa, colocar um vídeo no Youtube e disponibilizar o disco para download em algum site. Hoje em dia, este tipo de divulgação pode surtir muito mais efeito do que o marketing tradicional que despende rios de dinheiro. Tento ficar em um meio termo: tenho a estrutura da Som Livre e ao mesmo tempo busco uma verdade que você encontra mais facilmente entre os artistas independentes.

BD – E o próximo álbum? Já tem alguma ideia em mente? 

Marcelo Jeneci – Tento fugir desta obrigação de fazer um novo álbum tão rapidamente. Primeiro preciso me afastar de qualquer possível ilusão que eu tenha adquirido devido à excelente receptividade que obtive com o “Feito Pra Acabar”. Também tenho que me esquivar das pressões externas em fazer um álbum semelhante ou radicalmente diferente. E aí, com um pouco de dificuldade, tento achar o fio que me conduziu ao primeiro disco. Ou seja, tento buscar a intuição e a vontade de me expressar para fazer o segundo. Mas ainda pretendo me dar mais um ano para trabalhar em novas composições e, quem sabe, me deixar apaixonar por novas referências e novas sonoridades que, aos poucos, irão arquitetar e construir este segundo disco. Provavelmente, devo só gravá-lo no começo de 2013.

BD - Li uma entrevista sua afirmando que você e Laura formam uma “dupla inseparável como Cascatinha e Inhana ou The Carpenters”.  Qual a importância da Laura em sua música? Pretende continuar com esta parceira no próximo trabalho?

Marcelo Jeneci - Acho que nossa parceria neste trabalho materializa uma frase que dou muito valor: "Prefiro as coisas que existem antes de acontecer, às que acontecem antes de existir". Quando saí da casa dos meus pais, aos 19 anos, me mudei para o bairro da Pompéia, na Zona Oeste de São Paulo. No quarteirão onde morava, conheci o pai da Laura, o Rodrigo Rodrigues. Era, além de um grande amigo, um grande artista. Um excelente cantor, tocava violão, pandeiro, gaita, pintava quadros, fazia esculturas e tinha um único defeito, era Palmeirense. [Risos. Jeneci é corinthiano]. Apesar disso, nos demos muito bem. Ele queria montar um show em homenagem a Chet Baker. Sem exagero, ele cantava do mesmo jeito. Soube que em uma vinda de Caetano Veloso a São Paulo, o próprio convidou Rodrigo pra dar uma canja, dizendo: "Isto é São Paulo". Em outra ocasião, João Gilberto pediu ao Rodrigo para ajudá-lo a passar o som do violão e da voz antes do show! Ensaiei com ele muitas vezes em sua casa e via a Laura com seus 13,14,15 anos indo tomar aula de cello. Pouco tempo depois, Rodrigo adoeceu e morreu. Na saudade do amigo e com o projeto interrompido, vi Laura cantando pela primeira vez, em uma homenagem que os amigos fizeram a ele. A música era "Across The Universe" [The Beatles]. Fiquei chocado com a semelhança na sofisticação da voz. Ainda com vontade de continuar o que foi interrompido, começamos a conviver e descobrir várias afinidades musicais, até que certo dia, na sala da minha casa, por intuição e por uma inquietação que sentia, disse a ela: "Laura, vou começar a compor umas canções pra você cantar e pra gente montar um trabalho nosso, topa"? Foi quando fiz a minha primeira música, "Amado", com a Vanessa da Mata. E a partir daí fui fazendo outras. Aos poucos, Laura foi me encorajando a cantar e assim nasceu o repertório do show e do disco. Acho que se nossas vozes combinam, devem-se muito às coisas que existiram "antes de acontecer". E, respondendo à sua pergunta: claro, conto com ela no próximo disco!

BD – Uma das características marcantes no álbum “Feito Pra Acabar” é a presença de uma orquestra, regida por Arthur Verocai. Como foi isso? Não vejo muitos artistas da sua geração utilizando este recurso, até mesmo por questões financeiras...

Marcelo Jeneci – Isso só foi possível porque deu certo o tal plano A. Fui tendo esta vontade de ter uma orquestra de câmara no meu disco conforme fui percebendo que algumas canções pediam por isto, por uma maior dramaticidade nos arranjos. Acho emocionante uma seção de cordas executando uma melodia dentro de uma música. É muito bonito. Como as músicas do Roberto, aquelas mais românticas. Vejo ali uma influência direta da música romântica italiana, que também era muito orquestrada. Era natural naquela época. Então o meu desejo veio um pouco disto, da busca por uma sonoridade que sempre me agradou. Além da música popular, eu ouvia muitas trilhas sonoras quando era criança. Sempre fiquei com aquilo na cabeça, com vontade de fazer um trabalho que trouxesse uma imagem cinematográfica. Então, somando tudo isto, as referências com a busca por uma sonoridade orquestrada, o meu encontro com o Arthur Verocai deu no que deu. Estava em uma situação em que senti uma grande necessidade de olhar para trás para poder achar uma identidade e fazer o meu trabalho. É um pouco estúpido pensar que a vida só caminha para frente. A vida é como o pensamento, vai para trás, vai para frente, vai para os lados... Buscar por uma modernidade também quer dizer olhar pra trás. Um exagero nesse sentido pode trazer uma neura que acaba atrapalhando muitos artistas. Lembrei da frase de uma música que fiz com Arnaldo e Ortinho: “A coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer"... Hoje percebo que o meu papel na música brasileira é um pouco o de quem para e olha para trás, tentando repaginar algo que já foi feito e trazendo de volta uma serenidade e uma leveza que sensibilizem as pessoas. Quis gravar um disco que tivesse estes componentes em todas as músicas.

BD – Li que você chegou a integrar a banda Cidadão Instigado. Como foi esse período? O Catatau chegou a lhe influenciar de alguma maneira?

Marcelo Jeneci – Com certeza. O meu encontro com o Catatau aconteceu um pouco antes de começar a compor as minhas próprias músicas. Já estava sentindo uma inquietação e ele acabou me ajudando indiretamente. O Catatau é uma pessoa com uma personalidade singular e extremamente original, o que me inspirou para que começasse a busca por algo meu. A convivência com o Cidadão Instigado acabou me trazendo isto, esta vontade de achar uma linguagem que também fosse singular, que fosse autêntica. Toquei na banda por uns dois anos e foi muito bacana. O Cidadão é uma banda muito boa, que leva a música a sério, que entende que o nosso trabalho não é feito de sorrisos, charminhos, festas ou farras. Todos ali são muito sérios e se posicionam desta madeira, fazendo muito bem cada um o seu papel. O Cidadão tem uma grande importância por trazer à tona em São Paulo algumas referências que eu, vindo da Zona Leste, aos poucos identifiquei da onde vinha, mas que o pessoal da Zona Oeste não conhecia. O Catatau, justamente por ter sido criado em Fortaleza, ouviu, além de rock, muitos artistas da música popular de sua região, ou seja, da música brega e da música romântica. Ele trouxe esta referência para São Paulo, ou melhor, para o mercado editorial paulistano que está sempre em busca de algo novo, de uma nova música, de uma nova geração, de um novo hype. Ele foi recebido de braços abertos pela cidade e começou a tocar com muita gente, levando suas referências para o som dos artistas da cena atual. O interessante é que quando comecei a tocar com ele, primeiro na banda da Vanessa da Mata e depois no próprio Cidadão Instigado, percebi em sua música algo de familiar. Observando isto, percebi que eu havia percorrido, já que vivo de música desde os 15 anos, um caminho ao mesmo tempo parecido e repleto de outras referências, com outros valores e com um tipo diferente de abordagem. Aprendi muito e vivi muitas coisas com o Arnaldo, o Zé Miguel, o Luís Tatit... E, em um determinado momento, percebi que poderia unir todo esse aprendizado   com as referências da infância. O meu disco é o resultado desta junção, de uma vontade de fazer algo parecido com o que eu ouvia ali na infância e de trazer outras camadas que me foram apresentadas ao longo dos anos. É daí que vem o “Feito Pra Acabar”.

3 Responses to pelas esquinas de sua casa

  1. Edgar Araujo :

    Marcelo Jeneci realmente é o cara da Nova MPB. Ele e Tulipa dão orgulho de ver e escutar.

  2. Não tenho divida nenhuma de que Marcelo Jenecci é o mais novo astro da MPB Sou sua fã desde o primeiro momento em que ouvi FELICIDADE! SUCESSO Marcelo!!!

  3. Ah! só um detalhe, sou do interior do Rio, mais prescisamante Barra Mansa, sul do estado, e gostaria muito de ver vc tocando aqui na minha região. Cláudia

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