quem sabe, esta cidade me significa

fotos: daryan dornelles
Curitiba já não é mais a mesma. Ou melhor, Curitiba já não é mais a mesma há pelo menos uns dois anos. Nessa época, o clipe viral "Oração" d'A Banda Mais Bonita da Cidade chamou a atenção de todo o país, fazendo com que boa parte das mídias do eixo Rio-São Paulo voltasse sua atenção para a capital paranaense. E o que se encontrou foi algo bem diferente do que se imaginava: a cena curtibana não se resumia a meia dúzia de gatos pingados, ao contrário, tratava-se de dezenas de artistas que, tendo referências das mais diversas, formavam um dos cenários mais complexos da música independente brasileira. Surgidos no decorrer dos últimos dez anos, nomes como A Banda Mais Bonita da Cidade, Karol Conka, felixbravo, Banda Gentileza, Leo Fressato, Bonde do Rolê, Música de Ruiz, Boss in Drama, Ana Larousse, AUDAC, Esperanza, Janaina Fellini, Copacabana Clube, Luiz Felipe Leprevost, Tangerine and Elephants, Crocodilla, Trem Fantasma, Lemoskine, Simonami, Plexo Solar, Cabes MC, Uh La La!, Colorphonic, Savave, Confraria da Costa, Naked Girls & Aeroplanes, Cinema Mudo e Subburbia são apenas uma amostra da diversidade da produção local.
Integrando anteriormente a banda Casca de Nós, com quem lançou o disco “Tudo Tem Recheio”, o casal Téo Ruiz e Estrela Leminski criou o projeto Música de Ruiz em 2004. Dois anos depois, lançou seu primeiro disco homônimo, juntamente com o livro “Contra-Indústria”, onde abordou temas relacionados a produção musical brasileira. Filha dos poetas Paulo Leminski e Alice Ruiz, Estrela também dedicou-se à literatura, participando de antologias poéticas e publicando dois livros: “Cupido, Cuspido, Escarrado” e “Poesia é Não”. Em 2011, a dupla lançou o álbum "São Sons”, contando com diversas parceiras e participações especiais, entre elas, Ceumar, Kléber Albuquerque, Ná Ozzetti, Anelis Assumpção, Carlos Careqa, Janaína Fellini e André Abujamra. Estrela e Téo se apresentaram em vários festivais e projetos pelo país, como a Feira Internacional de Música de Fortaleza, Empório da Música de Goiânia, Festival de Inverno de Garanhuns e Itaú Cultural, além do Festival Bossanova, na Argentina, e na Fiesta de la Música e no Festival de las Artes de Castilla y León, na Espanha. Após o lançamento, em 2013, do DVD “São Sons” e do EP virtual “São Sons Ao Vivo”, a dupla passou a se dedicar à produção de um álbum duplo com músicas compostas por Paulo Leminski. O disco conta, até o momento, com as participações de Arnaldo Antunes, Zeca Baleiro, Zélia Duncan, André Abujamra, Anelis Assumpção, entre outros.
Em julho deste ano, Estrela e Téo vieram ao Rio se apresentar no festival Levada Oi Futuro. Aproveitamos a oportunidade e o convidamos para uma entrevista ao Banda Desenhada. A dupla, foi ao estúdio Fotonauta, em Santa Teresa, e conversou conosco a respeito de sua carreira, cena curitibana, vanguarda paulista e, claro, Paulo Liminski .

BD – Por conta das parcerias e até por Estrela ser filha de quem é, parece impossível ouvir “São Sons” e não se lembrar da vanguarda paulistana. Ela é realmente uma influência forte para vocês?

Estrela Leminski – Sim, com certeza. Muita gente comenta a respeito disso. Tanto por conta das parcerias quanto do meu histórico. Eu acompanhei muito de perto a trajetória de vários artistas que participaram da vanguarda e que eram amigos dos meus pais. Isso fez com que eu tomasse contato com o que eles produziam e sentisse uma forte identificação artística. Eram trabalhos superinteressantes e que não se encontravam no grande circuito. Tanto eu quanto o Téo sempre buscamos o diálogo com essas pessoas, sempre tivemos interesse no que elas estavam fazendo. E isso gerou diversas parcerias e uma grande intimidade musical. Quando você se torna parceiro de alguém, cria-se uma relação muito forte, muito íntima. Quase como se fosse um namoro. E, no meu caso, essas ligações ocorreram de forma bem natural. Morei em São Paulo quando era criança e, por isso, me tornei amiga dos filhos dos amigos dos meus pais. É muito legal, porque esses amigos de infância, também se tornaram artistas e atualmente produzem coisas maravilhosas! Sempre que nos encontramos, conversamos a respeito de trabalhos e parcerias. Acho que isso acabou provocando essa proximidade com a vanguarda paulistana. Por mais que eu seja de Curitiba e, junto com outros tantos artistas, também represente a cidade, sou muito próxima desse pessoal de São Paulo.

Téo Ruiz – Alguns artistas da vanguarda tornaram-se referências fundamentais para o nosso trabalho. O Itamar [Assumpção] e o Grupo Rumo, por exemplo, são importantes não só para nós como para outros nomes da nova geração. A Alzira Espíndola e outros músicos indiretamente conectados com a vanguarda, como o Mauricio Pereira, também são figuras muito importantes. São artistas que se preocupam bastante com o conteúdo de suas canções. Há um interesse em dizer algo de forma diferente, que toque o ouvinte de forma extramusical. Por exemplo, “Trovoa” [Mauricio Pereira], é uma música incrível, que comove as pessoas. Ela conta uma história completamente paulistana e ao mesmo tempo universal. Isso nos atrai muito e gera uma conexão com esses artistas. Na verdade, sempre fui atraído por eles e, mesmo antes de conhecê-los pessoalmente, eu já os tinha como influência.

Estrela Leminski – Nós sempre bebemos dessa fonte. A experimentação e a estranheza desses trabalhos provocam uma forma diferente de escuta, de compreensão e reflexão. E isso nos atrai muito. Quando fomos para o mestrado, esbarramos tantas vezes na vanguarda paulistana que ela acabou sendo o tema de nossas pesquisas. Nós nos debruçamos na obra desses artistas que, para nossa sorte, também são nossos amigos. E uma das coisas que discutimos bastante nessa época foi a exclusão da vanguarda paulistana na linha evolutiva da música brasileira, como Caetano gosta de falar. As pessoas pulam a vanguarda! Só agora é que se está falando dela. E isso se deve em grande parte à nova geração.

Téo Ruiz – Esse gap é bastante óbvio: a vanguarda paulistana foi um movimento que nunca dialogou com a grande mídia. Não foi um fenômeno de massa. Enquanto a estudávamos, chegamos a ouvir e ler diversas vezes que ela foi um movimento fracassado, que quase deu certo.

Estrela Leminski – [Exaltada] Mas o que é dar certo?! 


BD – Talvez a vanguarda suscite essas falas por dialogar tão pouco com a canção pop. Ela também estava bem distante de qualquer formato ou gênero previamente conhecido, como o rock, o jazz, o samba, etc. Não se percebiam referências claras ao tropicalismo ou à bossa nova, por exemplo.

Téo Ruiz – Mas é louco, porque o Itamar tem músicas que de certa forma são muito pop, que poderiam estar em uma novela, que poderia tocar maciçamente nas rádios. O próprio Mauricio Pereira! Claro, tanto ele quanto o Itamar têm músicas pouco convencionais, mas se começarmos a questionar isso, vamos acabar caindo naquela velha discussão de quais são os verdadeiros interesses da indústria musical. Houve um momento, no final dos anos 70, em que o foco foi alterado, passou-se a investir em outro tipo de artista, mais comercial e voltado para o entretenimento. Não que estes tenham um trabalho inferior, eu não quero entrar nesta questão, mas é óbvio que foi investido muito mais dinheiro nos trabalhos com apelo comercial. Depois do BRock, tirando algumas exceções como Lenine, Zélia Duncan e Zeca Baleiro, o que se ouvia era, basicamente, axé e pagode. Ou seja, música de entretenimento feita para vender e tocar em bares e em locais em que o público tenha outras preocupações que não a música. Houve um grande investimento nisso. E daí, claro, a vanguarda paulistana não conseguiu ser absorvida. Mas hoje, alguns artistas da nova geração, como eu e Estrela, Tulipa [Ruiz], Leo Cavalcanti e outros tantos, resolveram, ao seu modo, buscar essas referências, lançando uma nova luz sobre o movimento.

BD – Além dessa ligação com a vanguarda, vocês também estão associados à cena curitibana. Ela parece bem distinta das demais, não?

Estrela Leminski – Na verdade, há uma ligação entre as duas: tanto o Arrigo [Barnabé] quanto o Itamar são do Paraná. Assim como meus pais, que também são grandes referências para as duas cenas. Mas sinto que só agora a música curitibana ganhou destaque. A cena, atualmente, é muito forte e produtiva. E isso se deve bastante ao Bernardo Bravo. Ele foi responsável por criar vários festivais e promover a música de lá, fazendo com que as pessoas começassem a conhecer e consumir os trabalhos dos artistas locais. Isso culminou com o estouro d'A Banda Mais Bonita da Cidade: uma banda curitibana que toca quase que exclusivamente compositores curitibanos. O sucesso d’A Banda aqueceu o cenário musical da região e fez com que o resto do país começasse a voltar os olhos para nós.

BD – Vocês conseguem perceber alguma característica em comum entre os músicos da cidade?

Estrela Leminski – Acho que até bem pouco tempo Curitiba sofria de um complexo: todas as outras cidades têm como referência um gênero musical ou um aspecto folclórico que gera uma identidade e faz você reconhecer que algo é de Pernambuco, de São Paulo ou do Rio. Mas em Curitiba não tem isso.

Téo Ruiz – Pare para pensar: O que é o curitibano? Quais são os principais marcos da cidade? As estações de ônibus?! O Jardim Botânico? Sei lá! O curitibano não tem algo marcante por excelência que o identifique. Os cariocas têm o Corcovado, o samba, a praia... Os mineiros têm o Clube da Esquina e os paulistas têm o seu cosmopolitismo, a Avenida Paulista... Mas, e nós curitibanos? Nunca tivemos muita coisa, uma identidade explícita, entende? Isso tem a ver com a própria história da formação da cidade. Então como seria a nossa música? Não tínhamos muitas referências. Tivemos que criar a partir dessa ausência, utilizar esse vazio como matéria-prima.

Estrela Leminski – Foi bem complicado criar uma cena. Mas, como disse o Téo, justamente por não termos referências, nem amarras, estávamos livres para criar trabalhos inventivos, extremamente heterogêneos e cosmopolitas. Curitiba é isso, entende? A origem da cidade é essa, ela surgiu da confluência de pessoas do mundo todo. Perceber isso e utilizar essa característica como uma espécie de identidade acabou dando uma cara à cena. E a sua diversidade jamais afetou o diálogo entre os artistas. Por exemplo, nós somos parceiros musicais do felixbravo, dialogamos bastante, mas se você for ao show de um e de outro, verá que não temos nada a ver! Excetuando o viés poético, que é uma marca da produção curitibana. Nesse sentido, meus pais foram um marco importante para a cidade, por criarem um link com o que estava acontecendo no Rio e em São Paulo. Eles moraram aqui mais de uma vez. Entretanto, naquela época, mesmo com essas pontes, não foi possível dar vazão à produção musical de lá. Só agora que isto está acontecendo. Sinto que estamos vivendo um momento especial. Muitas coisas bacanas estão sendo feitas em Curitiba e, aos poucos, essa produção está conseguindo circular pelo país. Há compositores incríveis: Troy Rossilho, Leprevost... E superintérpretes! A Janaina Fellini, Rogéria Holtz, Iria Braga... Esses artistas estão conseguindo romper as barreiras.

Téo Ruiz – Na época do Paulo e da Alice, quando eles fizeram esse link com o Rio e São Paulo, quem mais se beneficiou foi a literatura curitibana. Pouquíssimos músicos tiveram algum destaque. Teve a Blindagem, que até conseguiu um contrato com gravadora, porém não chegou a ter ampla repercussão na mídia. Mas a referência literária na música curitibana é muito forte, você vê claramente isso na produção musical de hoje. E acredito que isso acabe se tornando um diferencial.

Estrela Leminski – Curitiba é a cidade com mais escritores por metro quadrado! [Risos].

Téo Ruiz – Isso não quer dizer que não há artistas de outras cidades que tenham essa mesma preocupação com o conteúdo poético da música, mas acho que em Curitiba isso fica mais claro.

BD – Parece que Leminski se tornou uma grande referência ao se falar em Curitiba, não?

Estrela Leminski – Eu percebo muito isso, de gente que cresceu lendo e ouvindo o meu pai... E diferente das outras cidades, Curitiba presenciou o seu lado compositor. Ele compôs bastante com a Blindagem e fez parcerias com Ivo Rordrigues, Marinho Galera.... Suas músicas tocavam nas rádios. Quando o [Jorge] Mautner se apresentava por lá, era meu pai que abria os shows. Muitas pessoas de Curitiba conhecem e cantam suas músicas. Ele é uma referência para vários artistas. Assim como a minha mãe. Quando meu pai morreu, ela continuou a manter a ponte com as outras cenas. Ela foi uma das principais parceiras de Itamar Assumpção, fez grandes músicas com Arnaldo Antunes, Zeca Baleiro, além de um disco inteiro com a Alzira Espíndola. Mas, ainda que eu reconheça essas influências, eu consegui construir um diálogo com diversos artistas a partir do meu trabalho, um trabalho que nunca pretendeu ser uma continuação da obra de meus pais.

Téo Ruiz – Hoje em dia você vê alguns dos poetas de lá, como o  Luiz Felipe Leprevost, que faz essa ponta entre a literatura e a música de forma bastante autêntica e que remete um pouco à poesia marginal. Você também vê essa característica em muitos outros artistas de lá.

Estrela Leminski – Eu acho que o meu pai acaba sendo uma referência para jovens e artistas que buscam rupturas. Porque ele foi um cara que, aos 40 anos e com toda a sua cultura, tinha uma banda punk, saía por aí vestido com uma jaqueta de couro e pichava poesia nos muros! Sabe?! Não é qualquer um que faz isso hoje. Imagina há trinta anos!

BD – E como vai o novo projeto sobre a obra musical do Leminski?

Estrela Leminski – Está uma loucura! Estou sofrendo um pouco para fazer porque preciso organizar todo o material e selecionar 24 músicas. Estou tentando me colocar no seu lugar, imaginando como ele agiria, e conciliando isso tudo com o orçamento e a unidade musical do disco. Terei que deixar de fora algumas que são importantes para mim. É algo muito delicado e pessoal. Mas estou bem apaixonada por esse projeto. Eu já vinha tentando concretizá-lo há bastante tempo...

Téo Ruiz – Você fala dele desde quando a gente se conheceu! [Risos].

Estrela Leminski – Há quatro anos que estou batalhando pra fazer esse disco. Mas sempre havia algum empecilho. Aos pouquinhos, parece que finalmente as pessoas estão tendo a noção real do tamanho da obra do meu pai. Ele não era só poeta, ele era diversas coisas, inclusive compositor. E compositor de mão cheia. Apesar de não ser um grande instrumentista. Ele era violonista autodidata e só tocava o suficiente para compor. Nem cantava muito bem. Era meio desafinado. [Risos]. Mas fazia músicas lindas, melodias incríveis! Ele era um grande cancionista. Enfim, estou bem empolgada com esse trabalho. E, como já disse, sofro bastante. Porque não poderei chamar todos os artistas que eu gostaria para participar do projeto. Nessa hora, faço o possível para deixar meu ego de lado. Quero que este disco tenha a cara do meu pai, como se ele mesmo tivesse produzindo. Fizemos um show desse projeto em Curitiba e foi impressionante. Lotou! Os ingressos acabaram em 24 horas! Abrimos uma segunda sessão e dois dias antes também já havia esgotado! 

BD – Em 2006, vocês lançaram um livro, “Contra-Indústria”. Poderia falar dele?

Téo Ruiz – O livro surgiu junto com o nosso primeiro disco, o “Música de Ruiz”. Estávamos fazendo especialização em música popular brasileira e o coordenador nos informou que poderíamos também fazer um disco como trabalho final, anexando algum material teórico. Durante o processo de pesquisa e gravação, notamos que havia muito poucos livros que tocassem nas questões que estávamos abordando. Era tudo muito fragmentado: um ensinava como se grava um disco, outro abordava a história da música popular brasileira enquanto outro analisava as tendências do mercado... Quando terminamos a pesquisa e começamos a escrever, vimos que tínhamos um material bem interessante e resolvemos publicá-lo. Ele é muito abrangente mesmo. Demos uma pincelada em vários assuntos que achávamos importantes: desde a história da música brasileira, passando pelas questões tecnológicas e de produção, até as leis de incentivo à cultura. Era essa a nossa ideia, mostrar um panorama geral. Queríamos que fosse um livro interessante tanto para quem está começando a carreira como músico quanto para o público interessado nessa área. Houve um esforço para que o livro, mesmo sendo escrito em uma linguagem acadêmica, fosse acessível a todos. Acho que conseguimos isso. Atualmente ele está esgotado, mas o disponibilizamos gratuitamente em nosso site. No mestrado, resolvemos nos aprofundar mais: a Estrela se dedicou à vanguarda paulistana e eu estudei produção e indústria musical, indo além da questão das grandes gravadoras, tentando posicionar o compositor no cenário atual. 

BD – Falando em indústria musical, no último álbum tem a faixa “‘Quirera”...

Estrela Leminski – [Cantarola] “Se vocês querem essa quirera de música de sucesso/ Espera, mas espera sentado contemplando o retrocesso”. Porque na verdade é isso, né? Hoje em dia, a música de entretenimento é totalmente descartável: “Essa banda já deu o que tinha que dar, qual é a próxima da fila?”. Você consome como se fosse polenta! [Risos]. Não se pensa mais em trajetória, em construir uma obra... Na verdade, a gente fez essa música há muito tempo, há quase 10 anos. É um pouco triste, porque ela ainda serve para os dias de hoje, ipsis litteris. Ou não! As leis de incentivo de lá pra cá pioraram muito! Dá até para fazer uma nova música sobre as distorções e absurdos das leis de incentivo!

Téo Ruiz – O Kiko [Dinucci] e o Douglas [Germano] fizeram aquela música, “O Retrato do Artista Quando Pede”: [Téo e Estrela cantarolam] “Pra sobrevier de arte em São Paulo/ Tenta o SESC, tenta o SESC/ Mas se o programador não for com a tua cara/ Esquece, esquece”. E também falam das leis de incentivo. Quando nos apresentamos com o Kiko, lá em Curitiba, cheguei a fazer uma paródia usando as nossas referências.

Estrela Leminski – E coube perfeitamente! Cabe em qualquer cidade!

Téo Ruiz – As leis de incentivo são mecanismos realmente muito importantes. Não questionamos isso. O problema é que não dá para depender somente delas. Mas, para muitos artistas, é a única opção. Quando ocorre alguma mudança, todos ficam desesperados! Não pode ser assim, entende? Elas deveriam ser apenas mais um mecanismo.

Estrela Leminski – Acho triste quando um artista faz um disco só para poder pegar a grana da lei de incentivo. A pessoa nem tem ideia de como será o trabalho, mas produz assim mesmo porque abriu o edital e pode pegar algum dinheiro. Enfim, essa é só uma das diversas distorções da lei.

Téo Ruiz – Aí é outra entrevista só pra isso! [Risos].



BD – Voltando ao último disco, “São Sons” é esteticamente muito heterogêneo. Como vocês conseguiram dar unidade ao álbum?

Téo Ruiz – Nós discutimos bastante, até notarmos que poderíamos criar uma unidade através das letras das canções. E na hora que fomos pensar os arranjos, foram elas que indicaram o caminho. Quisemos explorar essa ideia ao máximo, utilizando milhões de instrumentos e outras coisas mais. Tudo era válido para que pudéssemos passar a nossa mensagem. A letra realmente foi o grande fio condutor. E acredito que, com isso, o disco tenha ficado coeso. Mesmo trabalhando com gêneros diversos. Há tantas coisas para serem usadas, tantas coisas para serem ditas... Porque vamos nos restringir só ao samba ou ao rock? Nós resolvemos pegar tudo que estava ao nosso alcance. Intencionalmente. Um pouco como o Tom Zé, sabe? Tudo pode virar música.

Estrela Leminski – Nossas letras não tratam de temas estrambóticos e não temos a pretensão de sermos sempre geniais, falando coisas incríveis que ninguém jamais ouviu. Mas as letras e o conteúdo das canções realmente são muito importantes para se entender o “São Sons”. Claro que também existe uma unidade musical. Por exemplo, inserimos diversos ruídos nas músicas. Em “Quirera”, que é uma mistura de baião com milonga, sentimos a necessidade de um triângulo. Mas eu falei: “Não vou por um triângulo fazendo querequequé, querequequé, querequequé numa música dessas! Não mesmo!”. [Risos]. Então, a célula do triângulo foi feita no pé da mesa do estúdio de gravação. A ideia era utilizar diversos objetos como instrumento: caixa de fósforos, isqueiro, pacote de bolacha... queríamos provocar, causar um estranhamento através desses timbres.

Téo Ruiz – É importante dar um curto-circuito no ouvinte, entende? É isso que buscamos em nossa música. E a unidade do disco vem daí. Acho que no show isso fica mais claro. Nós condensamos todas as referências e optamos por uma linha mais rock’n’roll, com a formação tradicional: baixo, guitarra, bateria. Quando fomos gravar o DVD, inserimos um teclado, para utilizarmos algumas programações e timbres eletrônicos. Também passamos a utilizar projeções e outros elementos de multimídia. Mas, ainda assim, mantivemos a linha rock’n’roll.

BD – E o próximo álbum? Vocês já têm algum material novo?

Téo Ruiz – Disponibilizamos três músicas novas para download, extraídas do show, em formato EP. Estamos envolvidos em muitos projetos. Não temos tanta pressa em lançar um disco novo. Se ele sair no final de 2014 vai estar lindo, se sair no começo de 2015, tudo bem também.

Estela Leminski – Mas já temos algumas ideias. Queremos trabalhar mais essa questão da imagem, da multimídia. Vamos gravar as músicas novas e fazer clipes para todas elas. Eles serão gravados em Curitiba e nas  cidades que passarmos.

Téo Ruiz – É uma ideia bem recente. Sentamos e fizemos um brainstorm na semana passada. E aí surgiu esse formato de trabalho. Porque hoje em dia, por mais paradoxal que pareça, o músico está muito dependente da imagem. O disco por si só já não está mais bastando. Então pensamos em investir nos videoclipes. Haverá um roteiro para cada música. O primeiro clipe está mais ou menos desenhado e já começamos a gravar algumas imagens.


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